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04/02/2024

OS ÚLTIMOS GUERREIROS DO IMPÉRIO

 

 

 Autor. Rui Rodrigues

Publicação: Amadora : Editora Erasmos

Ano -, 1997 

 Descrição: 253 p. ; 24 cmISBN: 972-8301-03-0.

 

 

"A guerra é uma coisa horrorosa, é uma bestialidade: as pessoas matam-se umas às outras. Mas, por vezes, faz-se. E a verdade é que há diferentes maneiras de a fazer. Pode-se fazer achando que, apesar de tudo, os combatentes inimigos são criaturas de Deus, como nós, ou podemos olhá-las como meros indivíduos a abater, como se fossem animais." (declarações de José Pedro Simões Caçorino Dias, Coronel, p. 111)

 

"Para mim e para muitos camaradas meus, o mais revoltante foi o que se passou depois da independência da Guiné-Bissau. O mais revoltante era dizerem que éramos portugueses, quando afinal não éramos portugueses. Nós pensávamos que ficávamos portugueses, que pertencíamos à geração dos que pertencem a Portugal. Mas chegámos à conclusão de que não era assim. Não se podia imaginar que a tropa portuguesa ia mandar para a Guiné a lista dos que, lá, tinham pertencido à tropa portuguesa. Não sabemos quem é que mandou essa lista, mas sabemos que a mandaram, no tempo de Luís Cabral.  Eu estive preso cinco vezes, e na prisão mostravam essa lista, com o carimbo do quartel-general daqui e tudo, e com os nomes dos que tinham condecorações e louvores.

 

(...) Não culpamos o governador Bettencourt Rodrigues, que, esse, foi preso depois do 25 de Abril. Culpamos, sobretudo, o governador português e também o último governador que esteve lá, Carlos Fabião. Foi ele que nos disse que tinha recebido uma carta de Portugal, do general Spínola, para nós deixarmos a tropa. Precisamente no dia 19 de Agosto de 1974. Mostrou a carta, mas ninguém leu.

 

(...) No mês de Março de 1975 começaram as prisões. Foi um mês negro para os comandos. Eu fui preso. E fui torturado. Como muitos outros camaradas. Tenho testemunhas, e alguns estão cá em Portugal. Obrigaram-nos a carregar pneus gigantescos, pneus de Berliet, com jantes e tudo. Era uma das torturas, mas havia outras: como pendurar uma pessoa pelos pés, com cordas e dar-lhe chicotadas. Dentro da prisão obrigavam as pessoas a andar despidas, só com as cuecas. Em Bula obrigaram muitos camaradas a andar com pneus de Berliet à cabeça, na rua. O comandante do PAIGC, na altura em que faziam isso, chamava-se Benjamim Correia. Mas o homem da segurança, o carrasco de todos esses camaradas, foi Fernando Quadé.

 

(...) Houve camaradas que estiveram presos seis, sete ou oito anos. Alguns já tinham sido fuzilados, e os familiares continuavam a levar-lhes comida e cigarros. Às vezes, os guardas pediam cigarros, dos bons, para os presos: as famílias estranhavam, diziam que eles não fumavam. Diziam que tinham passado a fumar. Já estavam mortos. Outros ficaram aleijados para sempre, por causa dos maus tratos. Uma vez fui passar férias à Guiné, e encontrei um soldado da minha companhia, que tinha sido muito valente, chamado Mumó Sissé. Quando me viu começou a chorar. Contou-me que passou seis meses numa cela onde não se podia pôr de pé nem estender as pernas. Quando de lá saíu tinha uma perna e uma mão paralíticas. E por lá anda.

 

(...) Houve camaradas que foram presos no Senegal, na Gâmbia, e na Guiné-Conacry. Foram mandados para a Guiné como se fossem peixe, para serem fuzilados. Tudo se passou no tempo de Luís Cabral. Podem dizer o que quiserem de Nino Vieira, mas todas essas perseguições acabaram depois do golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980." [meu negrito] (declarações de João Seco Mamadu Mané, Fuzileiro Comando, pp. 166-168)

 

"Não posso nem quero deixar de dizer uma palavra sobre o que foi, depois, o destino desses homens do Batalhão de Comandos Africanos. Em 1974 estive em Londres, com o Dr. Mário Soares, o Dr. Almeida Santos e com o Prof. Jorge Campinos, já falecido, a negociar com o PAIGC, representado por Pedro Pires (...) As indicações que levava do general Spínola eram muito claras e eram as mesmas que tinha recebido, na Guiné, o major Carlos Fabião: aceitação pelo PAIGC de que ninguém tocava nos africanos, não só nos oficiais e sargentos do Batalhão de Comandos, como nos comandantes das milícias, que tinham cerca de 20 000 homens, com insígnias e uniformes próprios, e que tinham sido comandados pelo major Fabião. Nas nossas conversas com o PAIGC ficou sempre assente que haveria uma integração desses pessoal: não iam, com certeza, continuar a ser oficiais e sargentos, isso percebia-se, mas seriam reabsorvidos como civis. Não foi isso que o PAIGC fez. O PAIGC fuzilou barbaramente a maioria dos meus oficiais do Batalhão de Comandos Africanos. Creio que o primeiro a ser fuzilado foi o capitão Jamanca (...) Os meus oficiais foram assassinados pelo PAIGC, com conhecimento de Luís Cabral e de Nino Vieira. Não o posso provar, mas não tenho dúvidas nenhumas, pois tenho relatos de familiares, nomeadamente da mulher do tenente Zacarias Saiegh. Os meus sargentos foram também quase todos fuzilados; só nos soldados é que eles não tocaram.

 

(...) Disse-se que daqui, de Lisboa, foi mandada para a Guiné uma lista dos comandos africanos, com postos, condecorações, louvores e tudo.(...) Num programa de televisão, em 1994, Luís Cabral foi fortemente pressionado pelo comandante Alpoim Calvão - e viu-se que ele ficou aflito. Como é que ele podia não saber? Então ele era presidente e não sabia?"(declarações de João Almeida Bruno, General de Quatro Estrelas, pp. 76-78)

 

"No princípio, os jovens eram apanhados como pássaros para irem para a tropa, às vezes eram amarrados para não fugirem e depois eles punham nos papéis que eram voluntários. Nos últimos anos da guerra os guineenses já iam para a tropa voluntariamente, porque o PAIGC matava mulheres e crianças nos povoados que não estavam com eles." (declarações de Marcelino da Mata, Tenente Coronel Graduado Comando, p. 183)











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