1ª Edição. Novembro de 1975
Entre 1974 e 1977, avulta no jornalismo português o nome de Vera Lagoa (Maria Armanda Falcão). Esta mulher tornou-se exemplo de coragem popular. A jornalista Vera Lagoa (1916-1996) foi uma das principais “bandeiras” de uma forma de luta a favor do saneamento moral da sociedade portuguesa daquela época, na luta pela defesa da liberdade. Neste livro, reúnem-se crónicas de Vera Lagoa, em linguagem simples e direta, publicadas no jornal Tempo, denunciando e ridicularizando situações e pessoas comprometidas com a escalada comunista.
5/6/75 – 2/10/75
As revoluções são assim: não tardam a revelar dois tipos
característicos os «revolucionários» oportunistas, multidão palradora,
legião de medíocres, intermediários de ideias feitas, malta que procura
aproveitar a confusão em proveito pessoal, que se berram vítimas do
antigamente, e andam, cirandam de faca e garfo, esfomeados de postas; e
os verdadeiros revolucionários, esses do sentido colectivo, ideias
firmes, concepções construtivas, o futuro.
Os génios da nossa Praça – nas artes, nas letras, no jornalismo, na
política parecem, coitadinhos, desempregados desde o 25 de Abril de
1974. Basta olhar à nossa volta (onde estão?), basta saber ler (que
escrevem?), basta, basta, basta.
Vera Lagoa, essa mesma. A das «misses». A das «bisbilhotices». A das
frivolidades do antigamente, do 24 de Abril. A que inventou o supérfluo
quotidiano num país onde, durante 48 anos, foi proibido inventar. Que
riscos tremendos a Revolução lhe trazia, que perigos corria quando os
talentos de café desabrochassem, quando todos os nossos géniozinhos
florissem ao sol forte da Liberdade, quebradas as algemas do fascismo;
já sem vestidos compridos, sem lantejoulas as mulheres, sem jantaradas,
sem beija-mão que iria ser da «pobre» Vera Lagoa na Revolução, quando os
génios das artes, das letras, das ciências, dos jornalismos, criassem,
escrevessem, inventassem, cronicassem em liberdade?
O tempo, que nada perdoa, que se atreve com colunas de mármore quanto
mais com corações de cera, já deu parte da resposta. No «Tempo», onde
saíram estas crónicas que aí vão. Sem vestidos compridos, sem misses,
sem lantejoulas, sem jantaradas, sem beija-mãos. Mas em carne e sangue,
em democracia e liberdade, em coragem, em Povo. O Povo que semana a
semana, lê Vera Lagoa na comunhão de uma linguagem simples, sólida,
directa, livre – tão simples como as pedras, tão sólida como as árvores,
tão directa como a democracia, tão livre como a liberdade.
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